Minha coleção de ilusões.

O glorioso discurso de nossa presidente insuflou os corações de milhões de brasileiros essa noite: de forma concisa mas eloquente, demonstrou como o leilão do campo petroleiro de libra, o maior do pré-sal, que foi vencido por quatro multinacionais estrangeiras em parceria com a Petrobrás, vai propiciar ao país uma arrecadação fabulosa que, entre royalties, impostos e outros bônus poderão somar mais de um trilhão de reais durante o período previsto no contrato de exploração.

Além desse lucro do óleo, o país – segundo a presidente – ainda se beneficiaria com outros itens constantes no contrato desse novo meio de exploração partilhada: há um que prevê um número grande e crescente com o tempo de tecnologia nacional a ser utilizada nos equipamentos de exploração; aquecendo a indústria nacional; há outro que assegura a soberania do Estado para tomar decisões estratégicas na empreitada; há ainda um projeto de criar uma estatal dentro da Agência Nacional do Petróleo (anp) para gerir assuntos referentes exclusivamente ao pré-sal.

Dessa forma, concluiu a presidente, o Brasil, dentro de um prazo de algumas décadas estará duplicando sua capacidade de produção de petróleo, aumentando exponencialmente suas exportações, terá fortalecido grandemente sua indústria, gerado milhões de empregos, e tudo isso para produzir essa imensa riqueza que será investida principalmente na modernização do nosso sistema de educação, coroando esse período de progresso com a consolidação de um sistema que propicia a promoção da cultura, valor perene dos povos.

Naturalmente que esse discurso getulista gerou algumas expectativas maravilhosa dentro de mim e de uma porção de brasileiros que, como eu, desejam ver um Brasil forte, estável, seguro e solidário com seus cidadãos.

Sentí até uma vontadezinha de esquecer que essa mesma Petrobrás alardeava ainda há pouco a sua “ autossuficiência no petróleo”, sem que isso tenha resultado em nenhum ganho real para o povo que compra o precioso derivado nesse país; ou que essa mesma Petrobrás é alvo de investigações sobre possível fraude em aquisição de uma refinaria improdutiva nos EUA; ou que, de acordo com a rotina, a PPSA – a estatal criada para controlar o pré-sal – provavelmente se tornará cabide de emprego de parentes de poderosos e acobertará desvios e fraudes; que a Petrobrás é uma empresa mal-gerida, que serve de instrumento do governo para “regular” artificialmente o preço dos combustíveis, o que tem gerado muitas incertezas no mercado e comprometido a competitividade da mesma; que o acréscimo de renda para a União não significará nada se não houver uma grande reforma política (que não haverá) que propicie uma melhor gestão de recursos com otimização na qualidade dos gastos e na capacidade de fiscalização, que hoje não existe.

Desejei por um pequeno instante crer que dinheiro resolverá o problema de ensino nesse país, que soterrará o imenso abismo cultural que nos separa das nações que crescem de forma sustentável.

Quis acreditar que nossa indústria capenga, amarrada à infra-estrutura pífia daqui será capaz de produzir os equipamentos necessários com qualidade e preços competitivos.

Acabados os cinco minutos de glória da presidenta em rede nacional, após ter sintetizado as maiores preocupações do povo com retórica vazia e prognosticar tolamente um quadro improvável de crescimento que provavelmente não se sustentará, embrulhei meus melhores sonhos patrióticos e guardei-os na minha coleção de ilusões.