Por Que Trazer Um Filho Ao Mundo?

 Me deparei com a pergunta acima enquanto tentava assistir um vídeo no youtube.

 Apareceu-me como um daqueles comerciais que somos obrigados a suportar por angustiantes cinco segundos, para, na primeira oportunidade clicar em “pular o anúncio” . Mas não consegui pular esse: a contundência da pergunta me chamou a atenção.

 Há pouco mais de um ano eu mesmo me fazia essa pergunta, pensava que, caso me tornasse pai e apesar de qualquer esforço que fizesse na criação do meu bebê, dando-lhe amor, atenção, bons exemplos ao longo dos anos, mesmo assim ele ou ela estaria exposto a milhares de fatores alheios ao meu controle que poderiam interferir na sua saúde, caráter, atitudes, etc. Enfim, será que meus esforços para criar minha vindoura criança seriam o bastante para torna-la um cidadão do bem à despeito do influxo malévolo do mundo que nos rodeia? Poderia protege-la dos perigos que mais e mais nos espreitam em cada esquina por toda a parte?

 No comercial que eu assistira, a Unilever ( multinacional de gêneros como higiene pessoal, alimentação etc.) propõe que as mazelas que assolam esse mundo, como a fome e doenças que são decorrentes da falta de saneamento básico, estão prestes a ser suplantadas pela tecnologia humana, que já agora nos apresenta novas formas de produzir, processar e disponibilizar alimento e água potável em qualquer circunstância e lugar, sendo uma questão de passar uma geração para que os frutos desses conhecimentos maravilhosos se tornem acessíveis às camadas da sociedade que mais precisam.

 Apesar de tocante e motivador, o comercial desaponta pelo simplismo: será que podemos acreditar que estamos prontos para erradicar um problema como a fome com a nossa “maravilhosa tecnologia”? A pergunta deveria ser: será que o problema da fome pode ser solucionado com tecnologia? Mesmo que sendo fome e doença problemas gritantes que apelam para o que há de mais terrível em nossas mentes, não podemos considerar que outros como violência urbana, destruição do núcleo familiar influenciado pela mídia, precocidade sexual deveriam ser postos na perspectiva de fatores a se pesar na hora de conceber um filho?

 Se há sofrimento no mundo, se há fome, miséria, doenças, não posso acreditar que é porque nos faltam meios para resolver, técnicas modernas para atacar o problema, mas sim porque faltam pessoas que desejem utilizar os meios que já possuímos para dar cabo das questões, pessoas que possam ouvir os gritos de quem sofre e tomar partido.

 No século que se passou a tecnologia tem se aprimorado em passo rápido, o homem venceu distâncias, controlou doenças, ultrapassou obstáculos, tornou o mundo num grande quintal, num parque onde todos tem acesso, mas no mesmo passo que cresceu nosso conforto patrocinado pela ciência moderna, também cresceu nosso egoísmo, nossa indiferença pelo outro.

 Nesse ponto eu entendi que o marqueteiro da Unilever apenas arranhou a questão para tirar seus objetivos publicitários do contexto, mas eu com meus pensamentos, mesmo tendo agravado ainda mais a perspectiva do mundo da criança do amanhã, optei por ser pai mesmo assim: não importa o que o mundo reserva a essa criança, que dores sofrerá, que sofrimentos presenciará, que perigos terá de enfrentar na luta da vida, se eu puder ensiná-la a amar sobretudo, estarei dando a contribuição mais objetiva que posso para tornar o mundo um pouco melhor.

fome no mundo

Por: Rafael Merçola